Eu havia participado de uma parte dos protestos da quinta-feira da semana anterior, onde ocorreram choques terriveis entre os manifestantes e a Polícia Militar de São Paulo. Já havia decidido que participaria integralmente do protesto da segunda-feira, 17/6/2013, pois sentia que estava diante de um momento histórico para a cidade de São Paulo. Só não fazia idéia que seria histórico para o Brasil!
Cheguei ao Largo da Batata de metrô, junto com muita gente que também se dirigia à passeata. O clima era ameno, as pessoas estavam mobilizadas e alegres, era perceptível isso. Desci na estação Pinheiros, acatando a orientação do Metrô, e andei até a concentração. Foi o meu primeiro arrepio da noite: era muito mais gente do que eu imaginava.
Passei em um bar, comprei uma garrafa de água, e me meti na multidão. Muita gente com placas, cartazes, algumas fantasiadas. Muitas dessas pessoas se manifestava conta diferentes coisas, não só contra o aumento das passagens de ônibus: PEC 37, corrupção, Copa do Mundo, todas essas porcarias que essa bandalha política foi enfiando goela abaixo de nós, O POVO, estava sendo vomitada ali, de forma coletiva. Me senti à vontade, logo estava cantando com a galera, essa foi uma característica desta passeata, os diversos cantos que iam sucedendo, alguns com palavras de ordem, outros mais humorados. E tudo em paz, perfeitamente em paz!
"Brasil, vamo acordar! Um professor vale mais que o Neymar!"
Conforme íamos andando pela Avenida Faria Lima, a cada pessoa que colocava a cabeça para fora da janela, a multidão gritava "Vem, vem pra rua! Vem contra o aumento, vem!". Tivemos o apoio de diversas dessas pessoas, outras apenas olhavam, meio incrédulas, talvez imaginando quando poderiam ir para a casa. Alguns mais efusivos acenavam e colocavam lençois brancos nas janelas. Aquilo era a prova que de que o movimento, apartidário por natureza, tinha o apoio da população. Com esse pensamento, senti uma vontade de chorar pela primeira vez, ainda mais quando veio acompanhado da multidão cantando o hino nacional. Isso eu não vou esquecer jamais!
"Um, dois, três. Quatro, cinco, mil. Queremos que a Copa vá pra puta que o pariu"
Em determinado momento, já na parte "nova " da Faria Lima, diante daqueles prédios de arquitetura moderna e espelhada, o povo percebeu a imensidão de gente que compunha a passeata. Aquilo, junto com as primeiras informações que apareciam dando conta que cerca de 100 mil estavam na rua, animou todo mundo!! E dá-lhe cantoria e palavras de ordem.
"Que coincidência, não tem polícia e não tem mais violência!"
Muito legal foi a reação das pessoas paradas no transito, nos carros. Percebi que elas também davam seu apoio, seja buzinando no ritmo do canto que a massa mandava naquele momento, seja com o piscar das luzes nos ônibus. Foi especial perceber que estávamos unidos.
Quando a passeata pegou a Avenida Luis Carlos Berrini, saquei que o objetivo da liderança era de alguma forma botar o povo na cara da Rede Globo, emissora de tv que desde o começo das manifestações insistiu em dizer que o movimento era "puro vandalismo". Eu mesmo queria isso, ainda mais depois de ter visto o colunista da emissora, o cineasta Arnaldo Jabor, desmerecer cretinamente o movimento popular. E lá fomos nós! Pouco a pouco seguimos, e quando dei conta, já estava na alça de acesso da Ponte Estaiada, o acesso-cenário que a Rede Globo utiliza em seus telejornais.
"Ih, fudeu! O povo apareceu!"
Eu, que só tinha passado uma vez ali, de carro (a ponte não foi feita para pessoas andarem) estava caminhando por ela, junto de mais umas dez mil pessoas, pelo menos. Aquela massa enorme, unida. Cruzei a ponte, cheguei até a Marginal Pinheiros, tomada pelo povo. A multidão seguia , dizendo que iria até o Palácio do Governador. Para mim, já tinha dado. Voltei pela mesma ponte, cruzei para a outra margem do rio e me dirigi à estação de trem Berrini, que estava lotada. O povo gritava ali, "sem violência", uma principio de muvuca começou, e eu decidi seguir andando até a próxima estação (Vila Olímpia), menos muvucada. Minha sensação era uma mistura de cansaço com alegria, mas era mais como uma satisfação mesmo.
Ao descer na estação Pinheiros de trem, e fazer a baldeação para o metrô, a última e especial experiencia neste dia único: enquanto as pessoas iam descendo as escadas rolantes, TODOS nós cantávamos o hino nacional e cantos como "O povo acordou", em uníssono. E aquele canto fazia um eco estrondoso, e cada vez mais e mais. Ali estava a minha certeza, eu havia participado de um dia histórico na vida deste país.